J.Ferreira
Por muito que custe a um determinado grupo de cidadãos (políticos que se julgam a elite social), para se ser democrata não basta ter-se sido eleito.
Com efeito, muitos ditadores também tinham sido eleitos… democraticamente!...
E muitos dos eleitos transformam-se em autênticos ditadores. E, Salazar também o tinha sido. Ou será que Salazar também foi mentor de uma revolução invisível como os capitães de Abril ?...
Pois bem. Este é um problema que as democracias têm e terão eternamente dificuldade em gerir: saber até que ponto um estado pode dizer-se democrático simplesmente porque, com base num determinado programa de governo, um determinado partido alcança o poder e, arroga-se do direito de legislar indefinidamente, contra tudo e contra todos, ressalvando apenas a postura de uma minoria.
Note-se que, os deputados deste governo aprovaram uma lei cujo conteúdo, parafraseando George Orwell no seu livro “Animal Farm”, traduzido em português (e, certamente, não por acaso!) por “O Triunfo dos Porcos”, se poderia expressar na seguinte frase: “Todos os portugueses são iguais mas alguns são mais iguais que os outros”.
Referimo-nos, claramente, aos políticos que nos governam. Todos nos lembramos ainda das recentes alterações que o Governo introduziu no Sistema de Pensões dos funcionários Públicos, nomeadamente dos professores (que terão de trabalhar e descontar mais de 45 anos!), considerando que todos os portugueses deveriam ter a reforma na mesma idade. Tal, parece-nos claramente injusto pois, se alguns apenas começaram a fazer descontos aos 28 ou 38 anos, outros começaram aos 18 ou 25 por exemplo. Como se faz justiça de redistribuição dos descontos para aqueles que mais tempo descontam? Como se pode dizer que é justo atribuir-se uma reforma na mesma idade a dois companheiros de universidade se um termina o curso aos 25 anos e o outro, andando a passear os livros e a fazer o Estado gastar muito mais na sua formação, apenas termina o seu curso aos 35 anos? E vão os dois para a reforma com a mesma idade? Então um sairá para a reforma e o outro ficará a descontar mais uns 15 anitos… Pois, pois… Por isso, alguns companheiros de universidade deixarão de poder confraternizar com os seus colegas de curso pois perdem o direito de passar à reforma com 35 anos de descontos (ficando a trabalhar mais uns 10 anitos) mas mantém o direito de ir ao funeral… (isto se a ministra não os penalizar muito nas faltas…) Assim, só porque um aluno foi bem sucedido nos estudos, é agora penalizado por esta lei do Governo que menos dinheiro gastou na sua formação, pelo simples facto de não ter repetido nenhum ano!... Grande prémio para os alunos Excelentes… Trabalhar mais que os “insolentes”…
E são estes governantes que querem dizer que é importante ter sucesso nos estudos…? Uma “ova”, diria o povo! “Reguilas” são os que terminam o curso lá pela casa dos 35 anos (perguntem ao José Sócrates!…). É que, a reformarem-se com 65 anos, apenas terão feito descontos durante 30 anos… Os que acabam o curso com 25 (ou menos!) estão feitos: têm que descontar durante 45 anos… e fartar-se de trabalhar…até serem velhinhos como os outros… mas mais desgastados por terem iniciado mais cedo…! É esta a justiça que apregoam os socialistas…? É esta a meritocracia que tentam impor?
Só se depois de mortos, a família tivesse direito a um certo número de anos de reforma do falecido. Assim, sempre os mais penalizados teriam direito a deixar em herança o fruto dos seus descontos, que os herdeiros receberiam tipo “a título póstumo”… É que, com os cortes sistemáticos nos salários, e os congelamentos sucessivos na carreira, já nem a casa os funcionários públicos podem deixar de herança, uma vez que, não a levando o Estado nos impostos, os bancos encarregam-se de o fazer (para continuarem a apresentar lucros exorbitantes a que o perdão de impostos não é alheio!) ainda que seja tijolo por tijolo.
Aliás, não será, certamente, por terem trabalhado mais que a esperança média de vida se vai alongar… Antes o contrário, isso, sim, pode verificar-se. Ou será que o trabalho agora é tão importante medicinalmente que até dá juventude?
Com as suas medidas, este Governo está a passar, claramente, um atestado de incompetência ao actual Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva. De facto, foi durante o tempo de Cavaco Silva (em que este esteve à frente do governo do país como primeiro-ministro!) que foi construído o Estatuto da Carreira Docente que Sócrates diz desajustado e cheio de mordomias.
Para o governo de Cavaco Silva, o ECD era considerado um instrumento fundamental para a melhoria do Sucesso Educativo e da Educação em Portugal... Para além disso, José Sócrates passa também um atestado de incompetência ao seu companheiro (de governo e de partido), António Guterres, que, enquanto desempenhou as mesmas funções não deixou de reconhecer a função dos professores como fundamental ao avanço da sociedade...
Para José Sócrates, todas as profissões (excluindo, claro está, a dos políticos!) são todas igualmente desgastantes… E, se Deus quiser (ou mesmo que não queira, para quem acredita na oração, bastará rezar…!) todos terão igual saúde, se não mesmo uma saúde de ferro...
Claro está que, para o Governo, o importante não é fazer a igualdade, mas antes, adiar a idade da reforma, o que significa pagar a reforma aos cidadãos comuns durante muito menos tempo, pois a esperança de vida, pós idade da reforma, diminui à medida que se aumenta a idade da sua atribuição! Por incrível que pareça, o exemplo não foi dado pelos legisladores. Assim, lamentamos que sendo todos portugueses (e os políticos os maiores responsáveis por o país chegar ao estado em que está!), o Governo e a Assembleia da República, se tenham acobardado e tenham mantido as mordomias exageradas dos políticos que se “reformam” com pouco mais meia dúzia de descontos, “ainda com o sangue na guelra”, o mesmo princípio não tivesse sido aplicado aos titulares de cargos políticos e similares. Mais… O incrível é que, apesar de terem criado um estatuto especial para as subvenções vitalícias dos políticos, ainda assim, os governantes tiveram a ousadia de adiar a sua aplicação para as calendas gregas, isto é, lá para 2013, altura em que seguramente, nenhum deles estará pelos corredores do parlamento e os próximos políticos vão revogar a legislação agora criada, com o argumento de que “não contribui para dignificar a função de deputado e não atrai os melhores para a política”.
Vejamos agora mais pormenorizadamente o alcance das medidas de Sócrates.
Sócrates ignorou a especificidade de determinadas funções exigentes ao longo da carreira, como é o caso dos docentes.... Por isso, não sei se estão ou imaginar mas eu já vejo como professora dos vossos e nossos filhos, uma idosa e dinâmica senhora de 62 ou 63 anos leccionando, numa escola do primeiro ciclo, todas as áreas disciplinares (incluindo a Educação Física!), equilibrada na sua bengala… (Que beleza... Quanta ternura...! ). E a comunicação social ajudou o Governo a vender esta medida como uma medida justa, na crença de que "uma mentira muitas vezes repetida se transforma numa verdade"!
Como pode considerar-se que um aluno universitário que acaba o curso de professor quando já está com 30 anos (filhinho de papá que anda a passear livros e como tal reprova várias vezes mas não há problema - lá diz o ditado "água mole em pedra dura tanto bate até que fura" - porque enquanto estudante foi sempre um baldas e um cábula, apenas faça descontos durante 35 anos (30+35=65) enquanto outros colegas da mesma turma que concluíram o curso com apenas 22 anos (porque se esforçaram, tiveram sucesso e gastaram menos dinheiro ao Estado para se formarem), terão de trabalhar e de descontar 43 anos (22+43=65). É esta a igualdade de que Sócrates tanto fala? Já repararam? Colegas da mesma turma... Que começaram a descontar para a Segurança Social na mesma data... ! Chamam a isto Justiça?
A continuar assim, teremos uns cidadãos que frequentaram a universidade numa mesma data a gozar a sua reforma nos cafés e outros a trabalhar, apesar de ambos terem já descontado para o estado durante o mesmo tempo? Que deve contar para se ter direito a receber? O que se pagou ou os poucos ou muitos anos que se viveu…? Não é este um incentivo a começar a vida activa mais tarde… Ficar no mercado negro durante uns anos e depois descontar apenas a partir dos 30 anos? Ou vão fazer trabalhar até aos 80 anos os que começarem aos 40 a descontar?
Para salvaguardar as expectativas dos senhores deputados, a alteração do sistema de cálculo das pensões dos senhores políticos apenas terá aplicação a partir de 2013.
Por que motivo apenas em 2013?
Façam as contas e depressa verão que as próximas eleições legislativas serão (a manter-se no ritmo normal dos acontecimentos pois lá diz o povo “não há uma sem duas, nem duas sem três”, e como tal, pode haver outra bomba atómica presidencial…) em 2009. E as eleições seguintes? Em 2013. Claro! Contas bem feitas (convencidos, claro, que o povo português será sempre masoquista, e que depois de uma maioria absoluta, vem uma segunda maioria, ainda que não seja absoluta) havia que colocar como data de efeito da aplicação da lei aos deputados o ano de 2013! Desta forma, o Governo não desiludiu os seus comparsas e uma grande parte do conjunto de deputados que suportam o governo, bem como uns quantos da oposição, conseguirão reunir em 2013 as condições para terem direito a receber do Estado as suas (míseras!...) subvenções vitalícias (eufemismo para dizer não dizerem que passam a receber uma pensão ou reforma com tão poucos anos de "trabalho" ...)
Independentemente de muitos continuarem bem jovens e com capacidades para trabalhar – o que explica o facto de todos ou quase, após terminarem o mandato e abandonarem o Parlamento, passarem a ser titulares de cargos de chefia no sector público (por nomeação) ou de direcção no sector privado (para o que trataram das suas vidinhas enquanto se “passeavam” no Parlamento) – a verdade é que o ataque aos diferentes sectores da administração pública não teve nenhuma medida que se aplicasse aos deputados que servisse de exemplo para que os portugueses pudessem dizer que, de facto, os deputados eram os primeiros a dar o exemplo… Uma vez mais a sabedoria popular nos faz valer o seu ensinamento “quem parte e reparte e não fica com a melhor parte, ou é burro ou não tem arte”. Ora, caros leitores, até podemos considerar que os nossos deputados não têm lá muita arte mas teremos de reconhecer que, para tratarem das suas vidinhas, "são artistas"!
Até 2013, "muita água passará debaixo da ponte". Assim, podermos ter a certeza que, tal como diz o poeta “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, quando chegar a altura de se aplicar a lei, os senhores deputados de então não perderão a oportunidade de preparar os portugueses para a alteração da mesma, protelando a sua aplicação para as calendas gregas, sob a desculpa de que é necessário atrair "mais e melhores cães para os ditos ossos". E não se cansarão a esforços para levar os portugueses e a opinião pública a acreditar que é preciso valorizar o estatuto da função dos cidadãos que se dedicam à política (como já todos estamos cansados de ouvir e que ainda há dois anos era mote de conversas televisivas) argumentando com a “necessidade de cativar os melhores para a política”. Convictos da força dos media onde, “uma mentira muitas vezes repetida se transforma numa verdade”, não hesitarão a matracar tais ideias na comunicação social para legitimar o estatuto privilegiado para si mesmos.
Porém, que se saiba até ao presente, pode haver carência de mão-de-obra em vários sectores mas não consta que nenhum lugar de deputado ficasse por preencher até ao presente.
Pelo contrário, “são mais de trinta cães a um osso”! Se o estatuto é assim tão mau, por que concorrem? Altruísmo? Acreditam que se interessam pela coisa comum?
Não deveriam os políticos receber do erário público apenas o correspondente ao custo da satisfação das suas necessidades básicas para apenas atrair para a política aqueles que de facto se querem dedicar ao Estado e aos Portugueses? Se acham que é pouco… “Por que se candidatam”?
Por que não se aplica aqui a lei da oferta e da procura?
Ora, se estamos em ”época de vacas magras”, para quê pagar muito se há tantos candidatos e podemos pagar pouco?
Não lhes chega terem o reconhecimento social e os tachos que posteriormente lhes são oferecidos nas empresas por terem sido bons executores?
Ou será que têm medo de ser avaliados pelo seu desempenho e nenhuma empresa os queira integrar nas suas fileiras de trabalhadores?
Quase me arriscaria a fazer um pouco de futurologia e, ao estilo de Zandinga, dizer aqui que, chegando 2013, o Governo em exercício não hesitará em impedir a aplicabilidade da lei agora aprovada e reenviar de novo o início da sua aplicação para as calendas gregas. Duvidam? Também eu… Mas, “não há como esperar para ver”…
Não é por acaso que os lugares de deputados são tão apetecíveis.
Não é por acaso que usando uma vez mais expressões populares, “são trinta cães a um osso”;
Como os políticos são os que fazem as leis lá diria o povo:
São eles que “têm a faca e o queijo na mão” e, como tal eles ficam sempre com a melhor fatia ou não seria verdade que “quem parte e reparte e não fica com a melhor parte… ou é burro ou não tem arte”.
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